Uma das primeiras áreas a receber a intervenção do novo
Presidente norte-americano, Joe Biden, foi a saúde pública. O democrata
agiu rapidamente para coordenar um esforço de combate à pandemia de
covid-19, com passos dados para expandir a testagem e vacinação e
reforçando o uso de máscaras.
“As coisas vão continuar a piorar antes de melhorarem”, disse o novo Presidente, referindo-se à pandemia que assola o país. Biden fez ainda um apelo pessoal aos norte-americanos, pedindo-lhes que usem máscaras nos próximos 99 dias para travar a propagação do vírus.
“Este é um esforço de guerra”, declarou Biden. O tom
e planos do Presidente contrastam com os do antecessor, Donald Trump,
que procurou por diversas vezes desvalorizar a dimensão da crise.
As novas medidas decretadas por Biden ao longo do dia de ontem estabelecem um comité que irá aumentar a testagem, resolver as faltas de materiais,
estabelecer protocolos com viajantes internacionais e direcionar
recursos para as comunidades minoritárias mais duramente atingidas.
As novas regras obrigam ao uso de máscara em
aeroportos e em alguns transportes públicos, incluindo grande parte dos
comboios, aviões e autocarros de longo curso, avança a Reuters.
Ao apresentar o seu plano de luta contra a pandemia de covid-19, o
novo inquilino da Casa Branca disse também que os viajantes deveriam
estar em condições de apresentar um teste negativo ao vírus. Anunciou ainda que agora será obrigatória a quarentena para todos os que chegam de avião aos Estados Unidos.
A administração Biden vai ainda expandir a produção da vacina
e a sua capacidade de adquirir mais doses ao “aproveitar autoridades
contratuais, incluindo a Lei de Produção de Defesa”, de acordo com o
plano da Casa Branca.
Biden comprometeu-se a fornecer 100 milhões de doses da vacina
contra a covid-19 nos primeiros 100 dias no cargo de Presidente. O
plano tem como objetivo o aumento da vacinação, ao abranger mais
pessoas, tais como professores e empregados de caixa em supermercados.
O Presidente democrata colocou o combate à doença no topo de uma
lista de desafios da sua Administração, que também inclui tópicos como a
reconstrução de uma economia devastada e a injustiça racial.
O democrata propôs um plano de 1,9 mil milhões de dólares para melhorar
os subsídios de emprego e pagamentos diretos aos agregados familiares.
Contudo, algumas das primeiras iniciativas de Biden podem ficar
presas no Congresso, onde o Senado está a avaliar como proceder
relativamente ao julgamento de destituição de Trump.
Biden revoga “educação patriótica” em escolas
O Presidente dos EUA revogou um recente relatório do Governo de Donald Trump que pretendia promover a “educação patriótica” nas escolas, que foi criticado por historiadores por considerarem que se trata de propaganda política.
Numa ordem executiva assinada na quarta-feira, poucas horas depois de ter tomado posse como 46.º Presidente dos EUA, Biden dissolveu a Comissão 1776,
que tinha sido nomeada por Trump, e removeu um relatório que tinha sido
divulgado por esse grupo de especialistas na segunda-feira.
No relatório, que Trump esperava que fosse usado nas salas de aula de
todo o país, a Comissão 1776 glorificava os fundadores do país,
minimizando o papel dos Estados Unidos na escravidão, condenando o
crescimento da política progressista e argumentando que o movimento
pelos direitos civis tinha entrado em conflito com os ideais defendidos
pelos pais fundadores da nação.
O painel de especialistas da comissão, que não incluiu historiadores profissionais dos Estados Unidos, criticava as “ideologias falsas e de moda”,
que descrevem a história do país como de “opressão e vitimização”. Em
alternativa, o relatório recomendava um esforço renovado para promover
“um amor corajoso e honesto” pelos Estados Unidos.
A comunidade de historiadores norte-americanos criticou amplamente o relatório, dizendo que apresenta uma versão falsa e desatualizada da história norte-americana, ignorando décadas de investigação.
“É um insulto a todo o empreendimento educacional. A
educação deve ajudar os jovens a aprender a pensar criticamente”, disse
David Blight, um historiador da Guerra Civil, da Universidade de Yale,
acusando o relatório de ser “uma peça de propaganda da direita”.
O Governo de Trump referiu-se ao relatório como uma “crónica
definitiva da criação dos Estados Unidos”, mas historiadores dizem que
ignora as regras básicas de documentos científicos, nomeadamente não
possuindo referências bibliográficas para sustentar os argumentos.
O relatório também inclui várias passagens copiadas diretamente de
outros escritos, como um investigador descobriu, depois de analisar o
documento através de um programa informático para detetar plágios.
O relatório terminava pedindo uma mudança estrutural do ensino da história
nas escolas e nas universidades norte-americanas, que o painel de
especialistas descrevia como sendo “focos de antiamericanismo”.
Na sua ordem executiva de dissolução da Comissão 1776, Biden disse que o objetivo dessa iniciativa era “apagar a história de injustiça racial da América”.
Discórdia sobre o aborto
Joe Biden é o segundo Presidente católico, num país
em que o Cristianismo está em maioria (70,6% da população), mas é
representado essencialmente por protestantes. Os católicos representam
atualmente 20,8% da população norte-americana, recorda o Observador.
Biden não o esconde, sendo que no discurso inaugural, citou Santo
Agostinho. Ainda assim, o democrata está longe de ter uma relação
pacífica com o eleitorado católico, sobretudo com os mais
tradicionalistas, que Trump conseguiu atrair com políticas conservadoras
– por exemplo, posicionando-se contra o aborto.
O democrata defende o direito ao aborto e promete
transformar o Roe v. Wade – célebre processo judicial de 1973 cuja
jurisprudência é atualmente a proteção legal do aborto nos EUA – em lei.
A defesa do aborto tem dificultado a relação entre Biden e a sua própria Igreja.
No final de 2019, durante a campanha para as primárias democratas, um
padre católico proibiu Biden de comungar durante uma missa no estado da
Carolina do Sul, alegando que o democrata não se encontrava em comunhão
com a Igreja Católica: “Qualquer pessoa que defenda o aborto coloca-se
fora dos ensinamentos da Igreja”.
Ainda na quarta-feira, a Conferência Episcopal dos EUA publicou um
extenso comunicado congratulando Biden pela tomada de posse. Porém,
apesar da simpatia das primeiras linhas, é possível descortinar no
comunicado um tom bastante crítico de Biden ao longo do texto, em que a palavra “aborto” aparece oito vezes.
Por sua vez, o Papa Francisco enviou uma mensagem a Biden,
pedindo que “o povo americano continue a ir buscar força aos elevados
valores políticos, éticos e religiosos que inspiraram o país desde a
fundação”.
Na carta, o Papa destaca os desafios impostos pelas “graves crises
que a família humana enfrenta” no momento atual da história, mas
absteve-se de qualquer referência a questões como o aborto ou a
eutanásia.
https://zap.aeiou.pt/saude-educacao-religiao-biden-eua-374709