A adelfopoiese era uma cerimónia praticada historicamente na tradição cristã para unir duas pessoas do mesmo sexo – normalmente homens – num relacionamento reconhecido pela igreja, análogo ao irmão.
Segundo documentos históricos, com 20 anos, Simeão fez os votos monásticos no mosteiro de Abba Gerasimus, na Síria, juntamente com o seu amigo e companheiro asceta João de Edessa. Depois disso, Simeão e João passaram cerca de 29 anos no deserto, perto do Mar Morto.
João tinha acabado de casar quando foi passar quase três décadas no deserto. Para a esposa, as circunstâncias não eram ideais, mas, para João e Simeão, era o início de uma bela amizade que os levaria a fazer votos de fraternidade.
O nome desse rito sagrado, a adelfopoiese – traduzido do grego como “criação de irmãos” -, não era incomum para os cristãos bizantinos. A cerimónia servia para dois propósitos: solidificar uma amizade íntima entre dois irmãos em Cristo e como uma forma agressiva de networking, segundo o OZY.
De acordo com Claudia Rapp, professora de estudos bizantinos na Universidade de Viena, aprimeira iteração do ritual era uma forma de dois monges “viverem como irmãos em pares” para avançar na sua jornada espiritual
No entanto, a partir do século VI, muitos leigos adotaram a prática como uma “estratégia para networking”, continuou a investigadora. Neste último casos, os laços nem sempre eram eternos e podiam ser feitos com vários parceiros – embora, geralmente, um de cada vez.
Essa foi a tática usada pelo imperador Basílio I, que começou como um plebeu e, através de alguns ritos estratégicos, acabou por fundar o Império da Macedónia.
Durante a era bizantina, a adelfopoiese trazia vantagens importantes. Um plebeu poderia ser convidado para a casa do seu irmão mais rico, comparecendo a batizados, casamentos e a festas. Esse acesso incluía apresentações às filhas aristocráticas de famílias que normalmente as manteriam escondidas.
Na última fase da adelfopoiese, os homens eram advertidos de que a sua irmandade exigia que protegessem as mulheres da sua nova família das más intenções.
Contudo, ao longo dos anos, alguns estudiosos interrogaram-se se a adelfopoiese era, na verdade, uma forma discretamente aceite de casamento entre o mesmo sexo.
Em 1994, John Boswell, um historiador da Universidade de Yale, argumentou que muitas descrições antigas de amizade “são, no entanto, nitidamente românticas”. Boswell teorizou que a adelfopoiese unia dois homens numa união semelhante ao casamento e aprovada pela igreja.
No entanto, os críticos afirmam que o contexto social era mais aberto a amizades masculinas que eram menos reprimidas do que agora, por isso podem parecer românticas para os padrões modernos.
Como tal, a maioria dos estudiosos acredita que o ritual era usado principalmente como uma forma de solidificar amizades e formar alianças estratégicas.
Ainda assim, alguns católicos homossexuais de hoje usam a estrutura da adelfopoiese para formar uniões do mesmo sexo que, desde que permaneçam celibatárias, não desafiem a doutrina da Igreja.
Românticos ou não, eram relacionamentos profundos. Segundo “Symeon the Holy Fool”, de Derek Krueger, quando Simeão decidiu regressar à sociedade e fazer trabalhos de caridade, o seu irmão João sentiu como se “uma faca o separasse do seu corpo”.
Enquanto João voltou ao seu isolamento no deserto, Simeão passou a servir aos pobres na cidade de Emesa, no Líbano moderno, tornando-se deliberadamente “um tolo por Cristo” ao agir como um louco para não receber elogios pelas suas boas obras.
Pouco antes da sua morte em 588, Simeão contou ter visto o seu amado João numa visão.
Ambos foram nomeados santos depois de morrerem, partilhando o mesmo dia sagrado durante muitos séculos.
https://zap.aeiou.pt/antigo-rito-sagrado-entre-irmaos-pode-ter-sido-na-verdade-395203