O Ministério do Interior do Reino Unido terá criado um website dirigido aos requerentes de asilo com pedidos “enganosos” para os dissuadir de viajarem para o país. Foram também difundidos anúncios no Facebook e Instagram com alguns dos maiores perigos da travessia pelo Canal da Mancha.
O Reino Unido terá investido 23 mil libras (cerca de 27 mil euros) em publicidade no Facebook e no Instagram, destinada a dissuadir candidatos a asilo de viajarem para o país, e criou um site que contém informação incompleta, dúbia e até enganosa sobre o Reino Unido e as suas leis de asilo. O site chama-se On the Move e continua disponível.
A investigação, levada a cabo pelo The Independent, assegura que em nenhum lugar do website é indicada a ligação ao Governo britânico. Há, apenas, um email que o candidato a asilo pode usar para tirar dúvidas, sem saber que está a enviá-lo para uma dependência do Ministério da Administração Interna.
O diário avança, no entanto, que o site é propriedade do Executivo britânico e que foi criado em abril do ano passado. Quem o publicou usou uma ferramenta de registo privado que oculta informação sobre a sua autoria.
“Está a pensar viajar para o Reino Unido ilegalmente?” – esta é uma das primeiras perguntas que surge na página e quem responde que “sim” é direcionado para uma outra, que elenca os perigos “reais” e “jurídicos” para quem tentar fazer a travessia.
O Governo britânico avisa, por exemplo, que “o Reino Unido envia de volta ao país de onde partiram os que chegam por vias ilegais”, o que não não é verdade.
Desde 1 de janeiro de 2021, o Reino Unido não pode usufruir das provisões dos Acordos de Dublin, que preveem o reenvio de migrantes que chegaram primeiro, por exemplo, a Itália e sejam apanhados no Reino Unido a pedir asilo, explica o Expresso.
No site, lê-se também que é “crime” conduzir um barco através do Canal da Mancha sem autorização. Contudo, os processos criminais contra potenciais traficantes de pessoas são poucos, uma vez que não é fácil provar que quem vem ao leme de um barco é algo mais do que um migrante com experiência de pescador.
Diretrizes recentes do Ministério Público também impedem ação criminal contra quem conduza um barco com intuito de pedir asilo. Para tal, é necessária prova de envolvimento em atividades criminosas.
O site reserva uma parte para “formas legais e seguras” de chegar ao Reino Unido, mas não indica quais são. Limita-se a direcionar as pessoas para os sistemas de asilo noutros países europeus, como Bélgica ou França, e formas de pedir o regresso voluntário aos seus países de origem.
“Estou genuinamente horrorizada”
Membros da associação de ajuda humanitária Care4Calais, que presta auxílio a migrantes, revelaram ao The Independent que os migrantes não ficaram convencidos com a publicidade nem com o site.
Clare Moseley, fundadora do projeto, acusou a ministra da Administração Interna de “desperdiçar dinheiro” para tentar “enganar pessoas”.
“Estou genuinamente horrorizada com o tipo de coisas que este Governo tenta pôr em marcha para evitar ajudar pessoas que estão desesperadas”, disse, acrescentando que “a atitude é bastante ingénua, porque não serão anúncios nas redes sociais a dissuadi-los, esta viagem não é uma escolha“.
“Vimos estes anúncios e sabemos que a travessia é perigosa, mas é a nossa única hipótese de tentar algo melhor do que estar aqui na selva de Calais”, disse um sudanês.
Um migrante do Afeganistão contou aos voluntários da associação que não tinha vindo para Calais “por divertimento”. “Aceitamos esses perigos se significar chegar ao Reino Unido. Há muito pior do que isto em Cabul”, disse, numa referência à capital do país.
O chefe da divisão da Marinha britânica, Dan O’Mahoney, diz que o número de migrantes que tentam atravessar representa uma “escalada inaceitável” em relação a anos anteriores e alerta para as “viagens desnecessárias” em “pequenos barcos” que põem pessoas em “enorme perigo”.
“Os anúncios chegaram a milhares de pessoas em França e Bélgica e serviram para dissuadi-las de se lançarem nessas travessias perigosas com o intuito de chegar ao Reino Unido. Fornecemos também informação sobre como pedir asilo nos países seguros em que se encontram”, acrescentou, num comunicado divulgado após ter sido conhecidas as notícias sobre o assunto.
https://zap.aeiou.pt/on-the-move-governo-britanico-421996