A morte da directora de fotografia Halyna Hutchins, depois de ter sido atingida pelo actor Alec Baldwin durante as filmagens de “Rust”, deixou o mundo de cinema de Hollywood abalado. E ninguém percebe como é que a tragédia aconteceu.
Halyna Hutchins, diretora de fotografia de 42 anos, morreu no seu local de trabalho, um set de filmagens, durante as gravações do novo filme de Alec Baldwin. Intitulado “Rust”, este filme de baixo orçamento pode nunca chegar às salas de cinema depois da trágica morte, mas ficará certamente para a história e pelas piores razões.
As circunstâncias da morte de Halyna Hutchins ainda estão a ser investigadas. O que se sabe é que foi Alec Baldwin quem disparou o tiro que lhe roubou a vida, durante os ensaios de uma cena do filme.
Vários dados que antecederam esse episódio trágico acrescentam dúvidas à história.
Equipa substituída 6 horas antes do disparo fatal
Cerca de 6 horas antes de Alec Baldwin ter disparado a arma que matou a directora de fotografia, “meia dúzia de trabalhadores da equipe de filmagem saíram do set para protestar contra as condições de trabalho“, avança o Los Angeles Times (LAT).
Esses trabalhadores seriam sindicalizados no International Alliance of Theatrical Stage Employees e terão sido substituídos por vários elementos não sindicalizados, de modo a continuar as filmagens.
“Um dos produtores ordenou aos membros do sindicato para deixarem o set e ameaçou chamar a segurança para os remover se não saíssem voluntariamente”, revela uma fonte ao LAT.
O jornal refere que os “operadores de câmara e os seus assistentes estavam frustrados com as condições” de trabalho, incluindo as “longas horas” de filmagens as “longas viagens” que teriam de fazer, cerca de 200 quilómetros, todos os dias.
Além disso, haveria ainda atrasos nos pagamentos de salários.
Já tinha havido outros incidentes com armas
Por outro lado, fontes ouvidas pelo LAT e que não se quiseram identificar, asseguram que “os protocolos de segurança padrão da indústria, incluindo inspecções de armas, não foram estritamente seguidos” durante as filmagens.
“Pelo menos um dos operadores de câmara reclamou, no último fim de semana, com um gestor de produção por causa da segurança das armas no set“, aponta uma fonte citada pelo jornal.
Antes do disparo trágico de Alec Baldwin, já teria havido dois incidentes com “descargas de armas”.
Num dos casos, o duplo de Baldwin terá, “acidentalmente”, disparado dois tiros, no sábado passado, depois de o terem informado de que a arma estava “fria”, ou seja, sem munição, relata um elemento da equipa de filmagens em declarações ao LAT.
“Devia ter havido uma investigação sobre o que aconteceu”, acrescenta essa fonte, considerando que “não houve reuniões de segurança” e que “não havia garantia de que não voltaria a acontecer”.
“Tudo o que queriam era apressar, apressar, apressar“, queixa-se ainda esta fonte.
A empresa produtora do filme, a Rust Productions, já garantiu que “a segurança da equipa e do elenco é a [sua] prioridade máxima”, apontando que desconhece quaisquer “queixas oficiais relacionadas com a segurança de armas ou adereços”.
Mas, ainda assim, a produtora vai iniciar uma “revisão interna dos procedimentos”.
“Vamos continuar a cooperar com as autoridades de Santa Fé na sua investigação e oferecer serviços de ajuda mental ao elenco e à equipa durante este período trágico”, aponta ainda a Rust Productions.
Entretanto, as filmagens foram interrompidas sem data de regresso.
Como é que Halyna Hutchins foi atingida
O incidente trágico aconteceu ao 12º dia de filmagens dos 21 dias previstos.
A directora de fotografia terá sido atingida durante os ensaios de uma cena em que a personagem de Alec Baldwin tinha que disparar a arma, depois de a retirar do coldre, numa cena típica de um filme de cowboys. Ela estaria debruçada sobre um monitor, para alinhar o ângulo de filmagem da câmara.
O LAT refere que elementos da equipa de filmagens “já tinham gritado “arma fria” no set” – a indicação de que seria seguro usá-la -, mas que ainda não tinham recuado para a zona específica onde assistem às cenas, através de um monitor.
Halyna e o realizador do filme, Joel Souza, estariam a espreitar para um monitor, tal como um operador de câmara, para ver a melhor forma de filmar a cena do disparo de Alec Baldwin.
“Baldwin retirou a arma do coldre uma vez sem incidentes, mas da segunda vez que o fez, a munição voou em direcção ao trio” que estava reunido junto ao monitor, continua o LAT. “O projéctil passou a zumbir pelo operador de câmara, mas penetrou Hutchins perto do ombro e continuou até Souza”, acrescenta o jornal.
Joel Souza acabou por sofrer apenas ferimentos ligeiros. Mas Halyna não sobreviveu.
Arma devia ter pólvora seca, mas tinha munições reais
A Associated Press apurou que Alec Baldwin terá recebido a arma carregada das mãos de um assistente de direcção que lhe terá dito que estava “fria”, ou seja, que era seguro usá-la, momentos antes de a disparar.
Esse assistente não saberia que a arma estava carregada com munições reais, de acordo com o que a polícia apurou até ao momento. A arma deveria ter balas de pólvora seca.
Não se sabe onde estaria, na altura, a pessoa responsável por supervisionar as armas, ou seja, o armeiro. O LAT refere que se trata de uma jovem de 24 anos que é filha do “armeiro veterano Thell Reed” e que estaria a fazer o seu segundo filme nesta função, depois de ter supervisionado as armas de “The Old Way” com Clint Howard e Nicolas Cage.
O mandado de busca relacionada com a investigação à morte refere que a arma disparada era uma de três colocadas num carrinho de adereços fora da capela de madeira onde a cena estava a ser representada.
Não há ainda certezas sobre quantos cartuchos foram disparados, mas um invólucro terá sido retirado da arma depois do acidente pela responsável pelas armas. A arma foi depois entregue à polícia quando chegou ao local.
O sindicato que representa os profissionais dos adereços revelou que a arma tinha “uma única rodada viva“. O termo “viva” refere-se a uma arma carregada com algum tipo de material, por exemplo, uma “peça em branco pronta para filmagem”, como explica o LAT.
Entretanto, os responsáveis da série policial “The Rookie”, que passa na ABC, já anunciaram que vão deixar de usar armas reais nas filmagens, substituindo-as por réplicas de brincar e usando efeitos por computador para simular os flashes dos disparos.
O incidente deixou Hollywood em choque, com vários realizadores e cinematógrafos a apontarem que, hoje em dia, não faz sentido filmar com armas verdadeiras, dados os avanços nos efeitos especiais.
Alec Baldwin de “coração partido”
Pelas redes sociais correm imagens que mostram Alec Baldwin destroçado no momento em que terá tido conhecimento da morte de Halyna Hutchins.
“Não há palavras para descrever o meu choque e a tristeza em relação ao trágico acidente que tirou a vida a Halyna Hutchins, uma esposa, mãe e muito admirada colega nossa”, escreveu Alec Baldwin no Twitter, notando que está “a cooperar totalmente com a investigação policial”.
“O meu coração está partido pelo seu marido, o seu filho [de oito anos] e por todos os que conheciam e amavam Halyna”, frisa ainda o actor.
Muitos famosos têm reagido ao trágico incidente, deixando condolências à família de Halyna e enaltecendo o seu talento. Mas também há muitas pessoas a realçarem que “ninguém deveria ser morto por uma arma num set de filmagem“, como destaca a filha de Bruce Lee, Shannon Lee.
O filho de Bruce Lee, o actor Brandon Lee, morreu em 1993 num incidente com uma arma nas filmagens de “The Crow”.
A responsabilidade de Alec Baldwin no caso vai para lá do facto de ter premido o gatilho, uma vez que é um dos produtores do filme.
O actor é conhecido pelas posições anti-armas e as suas imitações de Donald Trump no programa “Saturday Night Live” foram muito elogiadas.
De resto, Alec Baldwin assumiu publicamente que discordava das políticas de Trump e chegou a dizer que regressaria à sua Irlanda natal, caso este ganhasse as eleições para a presidência dos EUA.
Entretanto, muitas pessoas recordam uma frase que o actor partilhou nas redes sociais em 2017, a propósito de um polícia que matou uma pessoa.
“Pergunto-me o que se sentirá por matar alguém por engano“, notou o actor há quatro anos. Agora, já terá a sua resposta.
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