As sanções impostas à Rússia por causa da guerra na Ucrânia estão a alimentar uma outra guerra, de tipo diplomático e comercial, em torno do gás natural. E o presidente dos EUA, Joe Biden, está a aproveitar o momento para “roubar” à Rússia o domínio sobre as exportações de gás natural para a Europa.
Biden e a União Europeia (UE) preparam-se para anunciar, nesta semana, um grande plano para redireccionar gás liquefeito dos EUA para a Europa. Esse cenário poderá permitir a imposição de novas sanções à Rússia, nomeadamente para atingir as importações deste combustível, o que seria um golpe fatal para as finanças do Governo de Vladimir Putin.
A UE importa 90% do gás que consome, sendo a Rússia responsável por cerca de 45% dessas importações, o que faz com que seja difícil para muitos países europeus imporem sanções ao regime de Putin no domínio da energia.
Entretanto, Putin já avisou que só vai aceitar o pagamento em rublos de países “inimigos”, ou seja, daqueles que impuserem sanções à Rússia. E esse é mais um motivo de preocupação que acresce à instabilidade que reina em plena crise energética.
No meio deste turbilhão de incertezas, os líderes europeus têm estudado como podem reduzir a dependência do gás russo. Ora, os EUA oferecem-se para ser parte importante da solução.
A Casa Branca e a União Europeia (UE) estarão “perto de um acordo” com vista ao fornecimento de gás dos EUA para a Europa, como
avança a agência Bloomberg.
O Conselheiro de Segurança Nacional de Biden, Jake Sullivan, anuncia que esse acordo deve ser anunciado nesta sexta-feira, como cita a mesma agência. Uma outra fonte refere à Bloomberg que os planos passam por “garantir o fornecimento de gás natural americano e de hidrogénio para a Europa”.
“Ponto final” na dependência europeia do gás russo
Sullivan define que está em causa colocar um “ponto final” à dependência europeia do gás russo, notando que Biden e os líderes europeus estão a definir “o roteiro prático de como fazer isso”, incluindo as “medidas” a tomar, como “os EUA podem contribuir” e “o que a Europa tem que fazer”.
“Tem sido um assunto de intensas idas e voltas ao longo dos últimos dias e semanas”, nota ainda Sullivan, prometendo novidades para esta sexta-feira.
“Pode-se esperar que os EUA procurem maneiras de aumentar o fornecimento de GNL [gás natural liqueifeito] para a Europa, não apenas ao longo dos anos, mas também ao longo dos meses”, refere ainda o Conselheiro de Biden.
Mas, para já, não se sabe como é que isso vai ser concretizado e é provável que Biden não consiga comprometer-se com o fornecimento de quantidades específicas de gás. Também não é certo se o acordo com a UE incluirá referências a preços.
Além disso, questiona-se também se os EUA terão capacidade para responder às necessidades europeias. Antes da viagem para a Europa, assessores de Biden reuniram-se com responsáveis de várias empresas petrolíferas nos EUA, incluindo da Exxon Mobil e da Marathon Petroleum, como revela a Bloomberg.
Esses encontros terão servido para avaliar se as petrolíferas norte-americanas estarão preparados para aumentar a produção. Mas também terá sido discutida “a possibilidade de compensar os déficits de produção se a UE decidir juntar-se aos EUA na proibição das importações de petróleo russo“, aponta a Bloomberg.
A concretização desta sanção seria uma forma de isolar ainda mais o regime de Putin do mundo, e seria também um choque financeiro fatal para as finanças da Rússia numa altura em que o país já
sente a crise financeira.
Por outro lado, será também uma vitória comercial de Biden contra o tradicional inimigo, desviando uma importante exportação russa para os EUA. E será um óptimo indicador para
fortalecer a popularidade do líder norte-americano.
No fim de contas, pode ser o plano perfeito para os EUA, pelo impulso económico que pode garantir para os próximos anos e pela forma como também pode enfraquecer a Rússia, o eterno inimigo.
Bruxelas quer UE com 80% de gás armazenado
A Comissão Europeia (CE) pretende implementar a obrigação mínima de 80% de armazenamento de gás na UE para o próximo Inverno, até início de novembro, para garantir o fornecimento energético. Essa percentagem deverá chegar aos 90% nos anos seguintes.
Esta é a resposta de Bruxelas “às preocupações sobre a continuação dos preços elevados da energia” no espaço comunitário numa altura em que os preços da luz e do gás batem máximos também ‘puxados’ pelas tensões da guerra da Ucrânia.
Os 18 dos 27 Estados-membros que têm instalações subterrâneas de gás devem, assim, assegurar o preenchimento até pelo menos 80% da capacidade até 1 de Novembro de 2022, aumentando para 90% nos anos seguintes, com objetivos intermédios de Fevereiro a Outubro.
Há duas semanas, a CE propôs a eliminação progressiva da dependência de combustíveis fósseis da Rússia antes de 2030, com aposta no gás natural liquefeito (GNL) e nas energias renováveis, estimando
reduzir, até final do ano, dois terços de importações de gás russo.
Na altura, o executivo comunitário defendeu ainda a conclusão do mercado interno da energia e a aposta em projectos transfronteiriços, como “as ligações essenciais” entre Portugal, Espanha e França e entre a Bulgária e a Grécia.
UE discute como responder à exigência de Putin
A Alemanha critica, entretanto, o anúncio feito por Putin de que Moscovo deixará de aceitar pagamentos em dólares ou euros pelo fornecimento de gás à UE.
Tal exigência “constitui uma ruptura de contrato”, declara o ministro da Economia alemão, Robert Habeck, numa conferência de imprensa em Berlim, anunciando que os parceiros europeus vão discutir “a forma de responder a esta exigência”.
Putin deu uma semana às autoridades russas para organizarem o novo sistema de pagamento em rublos depois de ter anunciado que a Rússia não aceitará mais pagamentos em dólares ou euros pelo fornecimento de gás à UE.
O presidente russo explicou que se tratava de uma reação ao congelamento de bens da Rússia no Ocidente por causa da sua ofensiva na Ucrânia.
A Alemanha está particularmente dependente do gás russo, que representa cerca de 55% das suas importações de gás. O país está a tentar reduzir rapidamente a sua dependência obtendo outros fornecedores.
Além de acelerar a construção de terminais de GNL, o Governo alemão também assinou um acordo com o Qatar, grande exportador desta matéria-prima, para um “abastecimento a longo prazo”.
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