Mais de uma centena de países (incluindo Portugal) recorriam a uma
empresa de encriptação que era secretamente controlada pela CIA e pelo
serviço secreto alemão BND. Uma investigação jornalística revelou como
os dois países tiveram acesso a vários segredos de Estado.
No ramo da encriptação, a empresa suíça Crypto AG era líder destacada.
Após ter trabalhado nas comunicações do Exército norte-americano durante
a II Guerra Mundial, mais de 120 países confiavam-lhe as comunicações
de espiões, diplomatas e militares. Esta empresa tinha como função
garantir que estas comunicações confidenciais permaneciam totalmente
secretas e seguras. Contudo, uma investigação liderada pelo diário
norte-americano The Washington Post revela que durante décadas a agência
de inteligência norte-americana CIA e o congénere alemão BND tiveram
acesso privilegiado a toda esta informação que deveria ter permanecido
secreta.
O The Washington Post e a transmissora pública germânica ZDF consultaram
documentação confidencial que pormenoriza a forma como estas agências
de serviços secretos consultavam e usavam a seu favor informação
confidencial de outros
Estados. Na lista que contém 12 nações europeias, Portugal e Espanha
foram dois dos países cujas informações foram vistas e analisadas pela
CIA e pelo BND, no âmbito desta operação.
Através de uma transacção secreta realizada na década de 1970, a CIA
adquiriu — no âmbito de uma “parceria altamente confidencial” com o
serviço alemão BND — a Crypto AG, passando a controlar todas as decisões
tomadas pela empresa. A investigação avança que CIA e o agora extinto
BND “manipulavam os equipamentos da empresa para que pudessem facilmente
decifrar os códigos que os países [clientes da Crypto AG] usavam para
enviar mensagens encriptadas”.
Esta operação foi baptizada inicialmente com o nome Thesaurus e depois
Rubicon. “Foi o golpe de espionagem do século”, conclui o relatório da
CIA citado pelo The Washington Post. Através do controlo da Crypto AG, a
CIA e o BND conseguiram, por exemplo, monitorizar a crise de reféns na
Embaixada dos Estados Unidos em Teerão (Irão) em 1979, fornecer
informações sobre o exército argentino ao Reino Unido durante a Guerra
das Malvinas (em 1982), acompanhar as campanhas de assassínio de
ditadores sul-americanos e
interceptar as mensagens de regozijo de responsáveis líbios após um
atentado numa discoteca em Berlim Ocidental, em 1986, que matou dois
soldados norte-americanos, especifica o artigo publicado pelo jornal
americano.
Apesar das muitas comunicações a que conseguiram aceder, dois dos
maiores rivais dos Estados Unidos, a União Soviética e a China, nunca
foram clientes da Crypto AG, com as suas comunicações a ficarem
fora do alcance destas agências. De acordo com o Washington Post, ambas
as nações suspeitavam que a empresa suíça tinha laços estreitos com os
Estados Unidos, afastando-se dos serviços prestados pela Crypto AG como
forma de protecção.
“Os governos estrangeiros pagavam muito dinheiro aos Estados Unidos e à
Alemanha Ocidental pelo privilégio de terem as suas comunicações mais
secretas analisadas por pelo menos dois países”, prossegue o relatório
datado de 2004 que resume a operação de espionagem montada pela agência
de inteligência norte-americana.
No início da década de 1990, o BND considerou que o risco de exposição
se tinha tornado demasiado grande, afastando-se do projecto montado com a
CIA. Por sua vez, a congénere norte-americana comprou a participação da
germânica na Crypto AG, continuando a monitorizar as comunicações feitas
pelos países que utilizavam os serviços da empresa suíça. O The
Washington Post afirma que a CIA só abandonou o projecto em 2018,
vendendo os activos da empresa que ainda detinha.
Nem a CIA e nem o BND quiseram comentar o conteúdo da investigação
jornalística, mas não negaram a autenticidade dos documentos
consultados, relata o The Washington Post. A empresa sueca Crypto
International, que comprou a Crypto AG, admitiu que esta investigação
jornalística era “muito alarmante”, assegurando, no entanto, que a
actual empresa “não tem qualquer ligação com a CIA ou com o BND”.
Fonte: https://novosinsolitos.blogspot.com/
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