Foram exibidas pela última vez em França na terça-feira as 26 peças da era colonial com origem no Benim, que vão agora ser devolvidas ao país original. A decisão mostra a tendência dos países colonizadores de reavaliar o legado do colonialismo e de devolver as peças e obras roubadas enquanto dominavam os países colonizados, peças essas que estão ainda em muitos museus no Ocidente.
As 26 peças em questão, — que incluem estátuas, tronos, machados cerimoniais, portas do palácio e tronos portáteis — foram saqueadas pelos franceses em 1892 durante guerras com o então reino de Dahomeu e ficarão em exibição no Museu do Quai Branly, em Paris, durante apenas seis dias, antes de serem enviadas para o país africano ainda este mês, escreve o France24.
A França aprovou a restituição das peças em 2020, depois de as considerar património público durante mais de um século. A decisão integra a estratégia de Emmanuel Macron para melhorar as relações e a imagem da França em África, especialmente entre os jovens. Macron também visitou a exposição na tarde desta quarta-feira.
O Eliseu afirma que o Presidente francês está comprometido com os povos africanos que sofreram com o colonialismo francês e quer que estes tenham a oportunidade de apreciar a sua cultura nos seus países e não só em museus na Europa. “A decisão marca um passo importante na criação de uma nova relação entre a França e África”, escreve a Presidência.
Macron também já tinha anunciado este mês que um tambor da Costa do Marfim, que está no mesmo museu, também seria devolvido. As decisões do Presidente também motivaram algumas críticas, com alguns directores de museus a dizerem que as obras têm interesse “universal” e opondo-se à sua devolução.
O presidente do Museu Quai Branly, Emmanuel Kasarherou, também anunciou que a instituição está a fazer uma avaliação detalhada às origens da sua colecção de mais de 300 mil artefactos, com o objectivo de “identificar objectos que tenham sido retirados de forma violenta, sem o consentimento dos donos, como espólios de guerra ou através da coerção da administração colonial”.
Desde a sua eleição em 2017 que Macron tem mudado a conversa na sociedade francesa sobre o impacto do domínio francês em África, tendo garantido num discurso a estudantes no Burkina-Faso que ia devolver os artefactos culturais das ex-colónias ao longo do seu mandato.
Um relatório ordenado pelo Presidente francês também concluiu que cerca de 90 mil objectos africanos estão em museus franceses, estando 70 mil só no Museu Quai Branly.
Macron também já descreveu as 26 peças que vão agora ser retornadas como “o orgulho do Benim“, mas o Presidente do país da África Ocidental quer mais. Patrice Talon já disse anteriormente que não está “satisfeito” com os “pequenos passos” da França e apelou a que o país fosse mais longe.
As peças vão ser exibidas em várias partes do país, incluindo num antigo bastião português na cidade de Uidá, onde o tráfico de escravos era recorrente.
Apelos às devoluções crescem de tom
A devolução da França ao Benim está longe de vir do nada. Nos últimos anos, têm crescido movimentos em vários países europeus que apelam à devolução do legado cultural às ex-colónias, incluindo em Portugal. Numa proposta de alteração ao Orçamento de Estado de 2020, Joacine Katar Moreira, na altura ainda deputada do Livre, propôs que se avaliasse o património dos museus e arquivos nacionais e que se devolvessem os artefactos às comunidades de origem.
A medida estava inserida numa proposta do Livre que pretende implementar um programa de “descolonização da cultura” e uma “estratégia nacional para a descolonização do conhecimento”, sendo uma oportunidade para Portugal “escolher ser parte de um movimento que congrega a procura de justiça histórica, ao mesmo tempo que responde às necessidades e desafios do tempo presente”.
Vários dos maiores museus do mundo, como o Louvre, o Getty, o Museu Britânico ou o Humboldt Forum também têm sido pressionados a devolver o património.
Entretanto, o Metropolitan Museum, em Nova Iorque, que é um dos maiores e mais conhecidos do mundo, anunciou que vai analisar a história de 45 objectos vindos do Camboja e que integram duas grandes colecções. Produzidos durante o império Khmer entre os séculos IX e XV, especula-se que tenham sido roubados durante as décadas finais do século XX.
O museu americano nota que foi ele próprio que sugeriu avançar com a investigação. “O MET tem uma longa e bem documentada história de responder a alegações respeitantes a obras de arte, restituindo objetos quando apropriado, sendo transparente sobre a proveniência das obras na coleção, e apoiando investigação mais aprofundadas através da partilha de toda a informação conhecida sobre proprietários”, afirmou o museu.
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