Quase 100 anos depois da Grande Depressão, surge a Grande Demissão. Nos Estados Unidos da América os números da economia têm registado um aumento visível mas os números de trabalhadores a demitirem-se também têm registado um aumento (ainda mais) visível, atingindo recordes.
Quando o coronavírus “fechou” o mundo, incluindo os EUA, o número de desempregados multiplicou-se por quatro. O cenário económico foi melhorando, em Junho de 2021 a taxa de desemprego já tinha descido para 5.9% mas, entretanto, apareceram as demissões por iniciativa dos trabalhadores: Abril de 2021 registou o recorde de 4 milhões de trabalhadores que abandonaram os seus empregos por opção própria. O maior número desde 2000, como aponta a BBC.
Mas o final do ano não trouxe uma diminuição de rescisões de contrato: em Novembro, 4.5 milhões de residentes nos EUA deixaram os seus empregos porque quiseram. Recorde em toda a estatística dos EUA.
Neste global destacam-se as secções de restauração e hotelaria: um milhão de trabalhadores desses sectores demitiu-se. Ou seja, em cada 16 trabalhadores, um deixou o cargo que ocupava.
Nas contas sublinhadas pelo portal Business Insider, verifica-se que, no total, três por cento dos trabalhadores nos EUA demitiram-se em Novembro do ano passado.
Praticamente o dobro dessa percentagem só em restauração e hotelaria.
Razões para demissões
Os motivos que originam tantos pedidos de demissão em pouco tempo são vários. O principal será o cansaço ou mesmo o esgotamento relacionado com a tarefa que tinham: as pessoas já queriam demitir-se antes da COVID-19 mas ganharam a coragem que faltava – ou apareceu a insegurança como motivo – para se demitirem agora.
O tele-trabalho também veio alterar as contas. Muitas pessoas estarão a deixar os trabalhos presenciais que tinham para assinarem por uma empresa que permite trabalhar em casa.
E depois podemos centrar-nos noutro factor, que é essencial na restauração e na hotelaria: a valorização e o empoderamento dos trabalhadores. Quem gere as empresas passou a dar mais valor a quem trabalha, em muitos locais. Flexibilidade, incentivos extra, inquéritos de satisfação e salários mais justos.
Em restauração e hotelaria abundam os postos com salários baixos. Não há perspectivas de progressão na carreira.
Assim, havendo oportunidade de emprego noutro lado (ou havendo margem para uma pausa na carreira laboral), o trabalhador, cansado de não ser valorizado – ou da própria tarefa que executava – e de não receber o salário que acharia correcto, sai por iniciativa própria.
Esta é uma fase marcada por empresas que já contratam “qualquer um que apareça”. Mas estes dados e estas conclusões demonstram que, sobretudo nestes sectores
mencionados (que representam 6.4% dos empregos a nível global), o maior problema na economia dos EUA não é a falta de mão-de-obra: é a falta de salários elevados.
No mundo de “lazer e hospitalidade” um trabalhador recebe em média 19.20 dólares por hora – o valor mais baixo nos EUA. E até era de 16.90 dólares, antes da pandemia.
Há trabalhadores a receber 2.13 dólares por hora. “Não admira que os trabalhadores estejam a deixar essa indústria”, disse ao portal o presidente do grupo One Fair Wage, Saru Jayaraman, que luta por salários justos nos EUA.
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