Ao longo dos últimos meses têm sido recorrentes os episódios relatados nas redes sociais de indivíduos que não têm AirTags mas que recebem alertas nos seus telemóveis relativamente à presença destas nas redondezas.
No início do ano, quando a Apple apresentou a sua mais recente novidade, as AirTag, explicou que os pequenos discos tinham como objetivo localizar objetos ou pertences importantes, tais como carteiras, malas de viagem ou carros, através de sistemas de localização com ligação aos demais dispositivos eletrónicos da marca norte-americana — como os iPhones, iPads ou outros.
No entanto, ao longo dos últimos meses, muitos utilizadores da Apple, mas não das AirTags, têm vindo a receber alertas relacionados com a presença dos ditos localizadores, o que levantou questões relacionadas com a sua segurança.
Ashley Estrada, de 24 anos, viu-se confrontada precisamente com esta situação. Numa noite de setembro, quando estava em casa de amigos, recebeu um aviso no seu iPhone. “AirTag detetada próximo de si”. Acontece que nem a jovem nem qualquer um dos seus acompanhantes se fazia acompanhar dos pequenos discos. Através do aviso era ainda possível perceber que o dispositivo tinha sido detetado há algumas horas e que tinha monitorizado todo o percurso feito por Ashley durante a tarde anterior.
Isto dez com que a própria se sentisse “violada”. “A minha reação foi algo como, ‘quem é que me está a seguir?’”, explicou ao The New York Times. A questão ganha contornos mais densos quando se percebe que este está longe de ser caso único. Nos últimos meses, escreve o jornal norte-americano, foram muitos os relatos que surgiram nas redes sociais como o Tik Tok, o Reddit e o Twitter, onde os utilizadores deixam provas dos momentos em que encontraram AirTags nos carros e em outros pertences.
Todos estas histórias têm aumentado as suspeitas de que os dispositivos podem possibilitar uma nova forma de stalking, a qual alguns grupos relacionados com a privacidade já anteciparam quando a tecnologia foi anunciada, em Abril. De momento, o problema já foi reconhecido pelo departamento da polícia de West Seneca, em Nova Iorque, que já emitiu uma declaração a alertar os cidadãos para o perigo de estarem a ser vigiados depois de as AirTags terem sido encontradas no topo de carros.
Na mesma linha, outro departamento da polícia do Canadá revelou que está a investigar casos de dispositivos colocados em carros de luxo para que, monitorizando a sua localização, pudessem ser roubados.
Apesar desta sequência, alguns especialistas em tecnologia consideram que as AirTags vieram apenas sublinhar um problema geral do setor e de todos os seus produtos que envolvem a localização. Estes emitem sinais digitais que podem ser detetados por aparelhos da cujos sistemas operativos pertencem à Apple. Os dispositivos posteriormente reportam onde é que a AirTag foi detetada pela última vez. A marca norte-americana, ao contrário das suas concorrentes, tem funcionalidades para impedir abusos, nomeadamente a notificação que Ashley Estrada recebeu, mas também a emissão de sinais sonoros.
A rede constitui, segundo Eva Galperin, especialista em cibersegurança, uma ameaça dada a ubiquidade dos produtos da Apple, devido à extensão da monitorização que é possível fazer dos movimentos das pessoas.
“A Apple automaticamente transformou todos os seus dispositivos IOS numa parte da rede que as AirTags usam para reportar a localização das AirTag. Essa rede é maior e mais poderosa do que a usada por outros localizadores. É mais poderosa para localizar e mais perigosa para perseguir indivíduos”, explicou Galperin.
Tal como é seu hábito, a Apple não revela dados sobre as vendas dos seus produtos e as AirTags não são exceção. Ainda assim, fez saber, através de um comunicado, que encara as questões relacionadas com a segurança dos seus clientes de forma “muito séria”, estando “comprometida com a segurança e privacidade das AirTags”. Simultaneamente, a Apple também apela a que qualquer pessoa que se sinta em perigo devido a alertas relacionados com os pequenos discos que contacte as forças da autoridade, para que estas, juntamente com a Apple, possa analisar as informações sobre a ligação original da AirTag em questão.
No entanto, e de acordo com os relatos recolhidos pelo NYT, muitas das queixas não tidas em consideração pela polícia, que desvaloriza os alertas nos telemóveis. Foi o que aconteceu com Ashley Strada, a quem foi dito que a sua situação se tratava de uma “não emergência” e que poderia entregar o dispositivo – entretanto descoberto na placa da matrícula da sua carrinha – na esquadra quando quisesse e apresentar uma queixa. Há ainda casos em que as autoridades dizem aos queixosos que as notificações não são provas suficientes.
A polícia de Los Angeles, onde Ashley Strada reside, por sua vez, garantiu à mesma fonte que não tinha conhecimento de casos em que as AirTags tenham sido usadas para localizar pessoas ou veículos, no entanto, a jovem de 24 anos revelou que, depois de publicar algumas fotos e vídeos nas redes sociais, foi contactada por um funcionário da Apple, em nome pessoal. Juntos, conseguiram chegar à efetiva proprietária da AirTag, uma mulher cuja morada remetia para o centro de Los Angeles. No entanto, são frequentes os casos em que os dispositivos nunca chegam a ser encontrados.
Este pode ser um problema ainda maior para qualquer indivíduo que não tenha nenhum dispositivo da Apple, o que significa que as AirTags não emitirão qualquer aviso e a monitorização continuará e os dados recolhidos enviados para o telemóvel do dono. No início do mês, a Apple lançou uma aplicação para telemóveis com sistema operativo Android capaz de detetar as AirTags, no entanto, cabe aos cidadãos a responsabilidade de a instalar e utilizar.
Para já, a empresa recusa ainda comentar se está a trabalhar com a Google para desenvolver uma tecnologia capaz de detetar os seus dispositivos localizadores mesmo a partir de telemóvel Android. Ainda assim, muitos dos visados pelos esquemas de perseguição esclarecem que estas medidas não são suficientes e que, apesar de acreditarem que a Apple desenhou as AirTags com boas intenções, a segurança da população está em risco devido a indivíduos.
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