O Presidente dos EUA, Joe Biden, chega esta quarta-feira à
Cornualha, para uma demorada e intensa visita à Europa, onde começará a
reunir com aliados ocidentais e terminará a discutir com a velha rival
Rússia.
“Neste momento de incerteza global, enquanto o mundo ainda luta com
uma pandemia que ocorre uma vez a cada século, esta viagem servirá para
perceber o compromisso renovado da América com os nossos aliados e para
provar a capacidade das democracias enfrentarem os desafios e deterem as
ameaças desta nova era”, escreveu Biden sobre a sua digressão, num
artigo de opinião publicado no jornal The Washington Post.
Quando aterrar no Reino Unido, Biden descerá as escadas do avião para
cumprimentar os responsáveis da única base de reabastecimento da Força
Aérea dos EUA na Europa, em Mildenhall, símbolo da presença militar
norte-americana, que servirá de mote e de inspiração para a cimeira da
NATO, na segunda-feira.
Aproveitando a estada em Bruxelas, para essa cimeira, o Presidente dos EUA terá uma conversa privada com o seu homólogo turco, Recep Erdogan,
líder de um país que também pertence à NATO, mas que não tem escondido
fortes divergências com Washington, nomeadamente quando se encosta a
Moscovo para negócios de armas que preocupam os aliados atlânticos.
Em Bruxelas, Biden vai insistir numa tecla que foi muitas vezes
tocada pelo seu antecessor, Donald Trump, pedindo aos aliados para
investirem mais em defesa, seguindo a linha do que já vinha dizendo
quando ainda era vice-Presidente de Barack Obama, mas suavizando a
mensagem com a promessa de que os EUA estão empenhados em realçar o
artigo cinco do tratado, que obriga todos os membros a sair em defesa de
um deles, sempre que este esteja ameaçado.
A NATO será um bom palco para Biden ensaiar o discurso da necessidade
de união perante as crescentes ameaças da China e da Rússia e lembrando
que essa coesão não pode ser posta em causa por atitudes como as da
Turquia.
“As portas têm dois lados, mas abrem e encerram com uma mesma
fechadura”, disse Biden, numa recente entrevista, defendendo que mesmo
os fóruns de parceiros devem ser lugares de cautela e desconfiança
política, onde as soluções devem ser sempre partilhadas.
Este princípio pode ser-lhe igualmente útil para a primeira de várias cimeiras em que participará na visita à Europa, no G7
(o grupo da sete economias mais desenvolvidas do planeta), que se
inicia na sexta-feira, na Cornualha, e a que Biden levará a sua mais
arrojada proposta em termos de política externa: criar uma poderosa
frente de países democráticos para enfrentar os regimes ditatoriais e
contrariar a tentação hegemónica e totalitária da China.
Para este propósito, Biden precisa dos seus mais próximos aliados,
começando pelo Reino Unido, com cujo primeiro-ministro, Boris Johnson,
se reunirá já na quinta-feira, com uma agenda em que as “relações especiais” entre os dois países
terão lugar primordial, levando os dois líderes a procurarem soluções
para definir o espaço desse entendimento na geoestratégia e, em
particular, na forma como os britânicos se posicionarão na era
pós-‘Brexit’.
Logo a seguir à cimeira da NATO, e sem sair de Bruxelas, no início da
próxima semana, Biden reúne-se com os líderes da União Europeia (UE),
naquele que parece ser o menos relevante dos pontos da agenda da
digressão presidencial, se confiarmos na atenção dada pelos ‘media’
norte-americanos nos dias que antecedem a viagem.
Mas as reuniões com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der
Leyen, e com o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel,
acabarão, certamente, por dar bons títulos nas páginas dos jornais do
outro lado do Atlântico, ou não fosse a China um dos temas das
conversas.
E, perante Von der Leyen e Michel, Biden repetirá a mensagem que
levou ao G7 e que deixou claro no seu texto de opinião do The Washington
Post:
“Vamos concentrar-nos em garantir que as democracias de mercado, e
não a China ou qualquer outro, escreverão as regras do século XXI sobre
comércio e tecnologia”, escreveu Biden sobre a cimeira com a UE,
antecipando que não escamoteará as divergências que tem com Bruxelas a
propósito dos entendimentos comerciais dos 27 com Pequim.
Após uma semana de cimeiras e encontros bilaterais, Biden guardou para o fim da digressão europeia um dos mais delicados desafios,
em termos de política externa, do seu início de mandato: o
relacionamento com o emblemático arquirrival dos Estados Unidos, a
Rússia.
Numa recente entrevista televisiva, Biden chamou “assassino” ao
Presidente russo, Vladimir Putin, com quem se irá encontrar na próxima
quarta-feira, em Genebra, e a quem prometeu dizer, olhos nos olhos, que
não tolerará “comportamentos que violem a soberania dos Estados Unidos”,
depois de o acusar de ter comandado ações de interferência nas eleições
presidenciais norte-americanas.
“O Presidente Putin sabe que eu não hesitarei em responder a futuras
ações danosas”, ameaçou Biden, referindo-se à conversa “franca e direta”
que quer ter com o líder russo e na qual os tratados de controlo de
armas, os mísseis russos apontados à Europa, a ameaça à soberania da
Ucrânia ou a prisão do opositor Alexei Navalny serão, todos, assuntos
incómodos.
O que realmente será dito nessa reunião, poderemos não o vir a saber
tão cedo, porque o conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Jake
Sullivan, já avisou que ainda não é certo que venha a existir uma
conferência de imprensa no final da cimeira russo-americana.
https://zap.aeiou.pt/biden-chega-a-europa-para-discutir-408140