Uma década após a criação da Convenção de Istambul, o marco dos tratados de direitos humanos para acabar com a violência de género, as mulheres enfrentam um ataque global aos seus direitos e segurança, alertaram ativistas.
Esta semana celebrou-se a 10.º aniversário desde que os primeiros 13 países assinaram a convenção, vista como um ponto de viragem nos esforços para enfrentar a violência contra as mulheres. Contudo, apesar de 46 estados terem assinado o tratado, existe uma pandemia de violência contra as mulheres, exacerbada e exposta pela covid-19, alertou Dubravka Šimonović, enviada especial da Organização das Nações Unidas (ONU).
“A pandemia de covid-19 revelou o que estava a acontecer antes”, disse Dubravka Šimonović, sublinhando que em todo o mundo houve um grande aumento nos contactos para as linhas de ajuda, relatos de mulheres desaparecidas ou mortas e escassez de abrigos seguros para as vítimas.
E frisou: “Existe uma pandemia de violência contra as mulheres, que não foi tratada de forma adequada num grande número de países”.
Em março, a Turquia, o berço da convenção, anunciou que se retiraria do tratado – visto como a primeira estrutura internacional juridicamente vinculativa para prevenir a violência doméstica, proteger as sobreviventes e promover a igualdade – a partir de julho.
Este foi o culminar da escalada antifeminista e anti-LGBTQ+ dos políticos turcos, incluindo o Presidente Recep Tayyip Erdogan. O chefe de Estado já declarou pública e repetidamente que não acredita na igualdade entre homens e mulheres.
“Perdemos uma rede de segurança”, disse Elif Ege, da organização Mor Çati, em Istambul. “A convenção de Istambul não foi implementada adequadamente ao longo dos anos, mas isso não significa que foi completamente ineficaz; foi uma ferramenta significativa nas organizações feministas”.
Na Ucrânia, tem havido forte oposição à assinatura e ratificação da convenção por parte de grupos religiosos, que a consideram uma ameaça aos “valores familiares”. A organização ucraniana Women’s Perspectives informou que tem recebido o dobro de pedidos de ajuda e que as mulheres enfrentam barreiras crescentes para ter acesso à justiça.
Miroslava Bobáková, codiretora do Fundo Eslovaco-Checo para Mulheres, disse que na Eslováquia – que também assinou o tratado – a convenção é vista cada vez mais como “a essência do mal”. A situação no país é especialmente terrível para as mães solteiras, para as mulheres que vivem na pobreza e para a comunidade cigana.
No México, 10 mulheres são mortas com base no género todos os dias. No Peru, entre março e julho de 2020, houve 11 mil casos de violência contra as mulheres, de acordo com o Ministério da Mulher, em que quase 30% dos agredidas tinham menos de 18 anos.
No Egito, que não assinou a convenção, aumentam as tentativas de silenciar ativistas feministas, por violarem os “valores familiares”. “Não ter uma esfera pública para discutir as coisas traz violência”, apontou Mozn Hassan, da organização Nazra. Tanto a responsável quanto como a organização enfrentam repetidos assédios por parte do estado.
Apesar de tudo, os ativistas defendem que a convenção de Istambul continua a ser uma arma poderosa na luta para acabar com a violência de género. “Apesar das desvantagens, vemos melhorias. Mesmo antes da ratificação, os 34 estados que assinaram [a convenção] implementaram novas leis para proteger as mulheres”, disse Šimonović.
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