Depois de ter sofrido um piores surtos de covid-19 do mundo, a vacinação na Índia continua aquém do necessário. Falta de oferta, alocação a clínicas privadas e falhas nos sistemas de agendamento são algumas das causas do problema.
Apesar de ter dentro das suas fronteiras o Serum Institute of India, o maior produtor de vacinas do mundo, na Índia apenas 4,2% da população já está totalmente vacinada, de acordo com o Our World in Data.
Ainda sem os resultados finais dos ensaios clínicos sobre a eficácia e segurança, no ano passado, Adar Poonawalla, CEO do Serum Institute, arriscou ao começar a produzir vacinas em massa, com um foco especial na Astrazeneca, que acreditou ser útil para países com menos recursos por não exigir temperaturas tão baixas para a conservação.
O risco acabou por compensar quando, em finais de 2020, os ensaios clínicos mostraram resultados positivos. Quando os países começaram a aprovar e encomendar doses da Oxford-Astrazeneca, o Serum Institute já tinha milhões de doses prontas para distribuir e Poonawalla tinha prometido que metade da produção ficaria na Índia.
A promessa foi suficiente para que a Índia definisse metas ambiciosas no início da campanha de vacinação. O problema foi que o governo não encomendou doses suficientes a tempo de cumprir os objectivos.
Foi só cinco dias antes do início da vacinação a nível nacional que o governo de Narendra Modi fez a primeira encomenda da vacina da Astrazeneca aos laboratórios. A encomenda foi também muito modesta: apenas 11 milhões de doses para um país com 1.4 mil milhões de habitantes, o segundo mais populoso do mundo.
A segunda encomenda foi maior, de 45 milhões de doses, mas ainda insuficiente. Para além do Serum Institute, o governo encomendou também um pequeno número de doses a outra empresa indiana, Bharat Biotech.
Na altura, em Janeiro, a pandemia estava controlada, não havendo uma necessidade urgente das vacinas. O governo estava também a negociar melhores preços com o Serum Institute antes de comprar mais e doou milhões de doses a países vizinhos.
Todo este contexto ajuda a explicar a falta de preparação que ficou clara quando a segunda vaga chegou à Índia. Entre finais de Abril e meados de Maio, o país viveu uma situação caótica, com dias em que se registaram 400 mil novos casos e quase 5000 mortes.
Houve falta de oxigénio nos hospitais e o país precisou de pedir ajuda à comunidade internacional. O sistema de testagem também colapsou, pelo que os números podem ter sido ainda mais altos do que os dados oficiais indicam e as aplicações usadas para marcar a vacinação falham constantemente.
Com a situação que o país vivia, o governo teve de parar de exportar vacinas para as usar domesticamente e começou a ficar com todas as doses produzidas na Índia. O Serum Institute, que ia ser o maior fornecedor do COVAX, teve de abandonar o programa que distribui doses pelos países pobres.
Mesmo toda a produção do Serum Institute a ser usada na Índia continuava a não ser suficiente e muitos indianos que já tinham recebido a primeira dose não conseguiram receber a segunda.
O governo estendeu o intervalo entre as doses da Astrazeneca, mas negou estar a racionar as vacinas, justificando que a decisão se baseava em novos dados científicos. Mas a própria comissão científica que aconselha o governo revelou à Reuters que não apoiou a decisão. O executivo de Modi também alocou cerca de 25% da oferta para clínicas privadas, o que dificultou o acesso à maioria dos indianos.
Apesar de ter prometido aumentar a produção, a determinação de preços máximos pelo governo, o Institute justifica que a determinação de preços máximos pelo governo, a falta de matérias-primas e um incêndio em parte das instalações impossibilitaram o cumprimento das metas.
Estas justificações não foram suficientes para muitos críticos e Poonawalla deixou a Índia em finais de Abril depois de receber ameaças por parte de figuras importantes no país, revelou em entrevista ao The Times.
A 21 de Junho, o país vacinou 8.6 milhões de pessoas, o recorde diário do país até agora. No entanto, o governo espera conseguir vacinar até 10 milhões de indianos por dia até fim de Julho.
A segunda vaga de covid-19 na Índia atingiu proporções tão grandes em parte devido a cerimónias religiosas em Abril, como escreve a BBC. Em Junho, voltaram a ver-se grandes multidões nos rituais sagrados nas margens do rio Ganges, o que tem aumentado as preocupações dos especialistas sobre uma possível terceira vaga no país.
https://zap.aeiou.pt/a-india-e-o-maior-produtor-de-vacinas-mundial-mas-tem-apenas-4-da-populacao-vacinada-413874
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