Numa altura em que as polacas lutam contra a proibição quase total do aborto no país, vários alunos estão a ser recompensados por fazerem trabalhos artísticos pró-vida.
De acordo com a Vice Media, a competição nacional, chamada “Ajuda a Salvar a Vida dos Indefesos” em Português, tem sido conduzida por uma organização pró-vida nas últimas duas décadas, mas este ano, pela primeira vez, os alunos estão a receber pontos extra nos boletins escolares pela sua participação.
O concurso convida os jovens, com idades entre os 10 e os 18 anos, a explorar a sua criatividade literária, artística e musical na produção de trabalhos que abordem “questões bioéticas”, incluindo “a contraceção, o aborto, a fertilização in vitro e a eutanásia”.
No site da Associação Polaca dos Defensores da Vida Humana, que organiza a competição, é possível ver alguns dos vários trabalhos recebidos, como desenhos com as frases “por favor, não me deixes morrer” e “aborto é assassinato”.
Nem todas as regiões da Polónia aderiram ao concurso. Segundo esta empresa de media, a iniciativa está a ter mais força no sul do país. O Conselho Educativo da Pequena Polónia, região onde está localizada a cidade de Cracóvia, foi a primeira a reconhecer o concurso como uma atividade extra-curricular para os alunos conseguirem mais pontos. Depois, outras estruturas educativas de cidades como Lublin, Katowice e Białystok seguiram-lhe o exemplo.
Ativistas consideram que este é um sinal muito claro e preocupante de quão extremo se está a tornar o debate sobre o aborto na Polónia.
“As crianças devem aprender factos científicos, não uma ideologia religiosa assente na lavagem cerebral. É uma campanha ofensiva, dirigida pela Igreja polaca e apoiada pelo Governo”, disse Kacper Holda, vice-presidente da Esquerda Jovem, citado pela Vice.
Recorde-se que, em janeiro, entrou em vigor no país uma lei que torna praticamente impossível interromper voluntariamente a gravidez. Com a nova legislação, o aborto só é permitido em casos de violação, incesto ou quando a vida da mãe estiver em perigo, o que afasta este país extremamente católico da generalidade da Europa nesta matéria.
Malgorzata Nogalska, diretora de uma escola secundária, foi uma das polacas que participou nos protestos contra a nova lei, tendo também partilhado mensagens de apoio ao movimento nas redes sociais.
A polaca acabou por ser denunciada ao conselho educativo, controlado por apoiantes do partido no poder, por supostamente instigar a violência entre os seus alunos e está agora a ser investigada por uma comissão disciplinar de professores.
“Podem punir-me com uma repreensão, podem demitir-me e, em último caso, podem até impedir-me de ser novamente professora. Sim, é uma situação muito stressante e que está a ter impacto na minha saúde e na minha vida”, lamentou.
E, segundo a Vice, o caso de Nogalska não é exceção. Iwona Ochaka, diretora de uma escola primária e professora de Polaco, foi fotografada e filmada num dos protestos e também acabou por ser denunciada ao conselho educativo. Mas esta polaca está pronta para ir à luta.
“A repressão das autoridades só reforçou a minha convicção de que minhas ações pelos direitos das mulheres foram as corretas”, afirmou ao mesmo site, acrescentando que, nas escolas polacas, “há censura sobre tudo o que é físico ou relacionado com a sexualidade”.
E não são só os professores que são alvo desta repressão. Em algumas escolas, os alunos foram proibidos de usar o símbolo dos protestos nos seus perfis online e, como resultado, alguns foram mesmo afastados das aulas à distância.
Maciej Rauhut, de 14 anos, partilhou um post no Facebook sobre uma manifestação que iria acontecer na sua cidade. Horas depois, dois polícias apareceram à porta de sua casa e acusaram-no de organizar um protesto ilegal.
O jovem foi ameaçado com uma pena de quatro anos num centro de detenção de menores e outros quatro numa prisão, mas o caso foi amplamente divulgado pelos meios de comunicação social e as acusações acabaram por ser retiradas.
“Para a minha mãe, toda esta situação com a polícia foi muito complicada. Ela chegou mesmo a pensar que eu ia ser privado da minha liberdade. (…) O meu único pensamento foi que estamos a viver num regime totalitário.”
https://zap.aeiou.pt/alunos-polacos-trabalhos-anti-aborto-386993
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