Quando a covid-19 obrigou ao encerramento das escolas no Uganda, Livingstone Musaala abriu mão do seu trabalho como professor de matemática para se dedicar à construção de caixões de valor acessível – numa altura em que estavam a morrer muitas pessoas, vítimas de covid-19, na região onde habita.
A escolha foi alvo de críticas, até mesmo da sua própria família, que o acusou de se estar a aproveitar da dramática situação na cidade de Bugobi, a cerca de 140 quilómetros a leste da capital Kampala.
“Entre todas as ideias de negócios, escolhes vender caixões, como se quisesses a morte da pessoas?”, condenou um familiar, lembra o professor de matemática.
A meio da pandemia, e numa altura em que não contava com nenhum salário, Musaala teve a ideia de produzir caixões a preços consideravelmente mais baixos do que aqueles que eram vendidos pela maioria das empresas, diante da grande procura causada pela pandemia. “Não foi uma decisão fácil, mas as pessoas agora dão-me valor”, refere.
Desta forma, os vizinhos da cidade de Bugobi deixaram de ter de percorrer longas distâncias para conseguirem ter acesso a caixões a preços mais baixos quando a morte de algum familiar lhes batia à porta.
“No pico da pandemia, os negócios iam bem, vendíamos dez caixões por dia“, conta o antigo professor, que agora é carpinteiro.
O sucesso do seu negócio atraiu outros 30 professores que estavam na mesma situação. E, assim tal como Musaala, a maioria não quer voltar agora para as salas de aulas, mesmo que as escolas reabram.
Sistema escolar em perigo
Esta insatisfação na classe ameaça o sistema escolar deste país da África Oriental, já muito castigado pelas consequências económicas e sociais da pandemia.
Segundo a AFP, cerca de 15 milhões de alunos deixaram de ir à escola, após o encerramento das instituições de ensino públicas, em março de 2020.
Algumas associações temem que esta situação tenha levado a um aumento da gravidez entre adolescentes e do trabalho infantil.
Passados vários meses, e sem qualquer recurso económico, muitas escolas foram transformadas em hotéis, ou restaurantes. Outras afundam-se em dívidas, incapazes de pagar os seus empréstimos, o que torna ainda mais incerta a remuneração dos professores que possam retomar as suas atividades.
“Entre a educação e a carpintaria, fico com a carpintaria, porque pagam bem”, disse Godfrey Mutyaba, que também optou por outra via profissional, à AFP. “Adoro ensinar, mas com um salário tão baixo não voltaria”, acrescenta.
Livingstone Musaala também decidiu que não vai mais dar aulas. Embora a pandemia agora tenha acalmado no país, o antigo professor irá permanecer como carpinteiro, sendo que o seu objetivo é diversificar a sua oferta com a fabricação de móveis.
“A covid-19 ensinou-se que existe vida fora do ensino”, remata.
https://zap.aeiou.pt/professores-fabricantes-de-caixoes-438059
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