Alguns russos não querem correr o risco de serem enviados para a guerra — com a qual não concordam —, optando por abandonar o seu país por tempo indeterminado.
No fim de semana que se seguiu à invasão da Ucrânia pela Rússia, naquilo que Vladimir Putin categorizou como uma “operação militar especial”, Vlodimir Zelenskyy decidiu implementar a lei marcial, a qual determinava que os homens com idades compreendidas entre os 18 e os 60 anos não poderiam abandonar o país e ajudar as suas forças militares nos combates. Mais de uma semana após o início do conflito, que não parece ter fim à vista, e contra todas as expectativas, há quem considere que o mesmo pode ser feito na Rússia, o que tem levado muitos a abandonar o país.
Foi o caso de Alexis Trubetskoy, diretor de uma escola de línguas em Moscovo, que na manhã em que a guerra começou decidiu que tinha de sair da Rússia. “Acordei, li as notícias em choque e percebi que tinha de sair o mais rápido possível. Ficou claro para mim que aquela invasão horrível iria mudar a Rússia para sempre“, explico ao The Guardian. “Espero voltar ao país que adoro, mas não é claro o que vai acontecer depois disto. O meu futuro foi me tirado, o país não será o mesmo.”
De acordo com jornalistas de órgãos de comunicação ocidentais que permanecem na Rússia, esta tem sido uma atitude cada vez mais adotada pelos cidadãos, sobretudo após a entrada em vigor da suspensão da circulação nos espaços aéreos de muitos países europeus — e não só —, o que evidencia o isolamento a que o país está destinado, fruto das sanções que lhe foram impostas.
Desde o início da invasão, mais de 7500 pessoas foram detidas em protestos anti-guerra em todo o território russo, segundo o site independente OVD-Info. Na mesma linha, esta sexta-feira ficou marcada pelo encerramento de muitos meios de comunicação russos que resistiam ao discurso do Kremlin, mas também pela suspensão da emissão de alguns meios de comunicação ocidentais, como a BBC, e redes sociais em solo russo.
Aqueles que abandonam o país mostram preocupação em relação às consequências económicas que a Rússia enfrentará a médio e longo prazo: desde que as sanções foram impostas, o rublo entrou em queda livre e a bolsa de valores tem estado fechada para evitar consequências mais gravosas. Diariamente, sucedem-se os anúncios das empresas ocidentais que vão suspender a sua atividade comercial no país, contribuindo para o seu isolamento.
Segundo o The Guardian, as pesquisas com o termo “emigração” escalaram ao longo da última semana na Rússia, ao passo que múltiplos canais foram criados no Telegram com cidadãos a discutir formas de abandonar o país.
De acordo com os investigadores em demografia, é expectável que o país assista a um êxodo da sua “força de trabalho com qualidade”, a qual pressente que “não existe futuro para ela na Rússia”. “Este êxodo significará a degradação da nação. O país não tem uma grande base de talentos. Sem eles, a Rússia não se consegue desenvolver a si própria”, descreve Andrei Kolesnikov, investigador na Carnegie Endowment.
As saídas do país têm sido aceleradas, como referido, pelos rumores de que as autoridades podem estar prestes a decretar a lei marcial, uma posição sem precedentes na história recente da Rússia e que pressupõe o fecho das fronteiras.
“Juntei a minha família depois de um amigo me ligar e contar sobre esta história da lei marcial. Marcamos lugares no primeiro voo disponível na terça-feira e voamos para um país aleatório no qual eu nunca tinha estado antes”, descreveu Anton, um gestor numa grande empresa russa de combustíveis e gás. “Não planeio lutar numa guerra que não começou por decisão minha.”
Ontem, numa declaração breve à imprensa, um porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov rejeitou qualquer hipótese de imposição da lei marcial, ao passo que uma fonte num dos principais aeroportos de Moscovo também fez saber que o fecho das fronteiras era um cenário “pouco provável“. “Não fomos informados de nada. Acho improvável. Ao mesmo tempo, estamos em guerra, por isso vamos ver.”
No entanto, as especulações têm-se adensado, o que se tem refletido na quantidade de lugares disponíveis nos voos que ainda restam. De acordo com o The Guardian, os voos para Erevã, Istambul ou Belgrado estavam repletos e uma viagem só de ida para o Dubai teria que ser adquirida por um preço de 4006 dólares, quando antes a compra era possível por 334 dólares. Os bilhetes de comboio para Helsínquia, com partida de São Petersburgo, também têm esgotado com frequência.
Há também relatos de homens que enfrentaram interrogatórios no momento da partida. Andrei, um diretor de cinema que habitante de Moscovo, diz ter sido retido antes da sua partida para Baku. A sua bagagem foi revistada e um dos agentes analisou o conteúdo das suas mensagens privadas em diferentes aplicações.
“Ele pegou no meu telemóvel e passou horas a desligar pelas conversas. Felizmente, eu apaguei todas as mensagens nas quais afirmei a minha oposição à guerra, tanto no Telegram como no Signal”, relatou. “Fui questionado se ‘realmente’ amava o meu país e se estava contra a guerra. Perguntou-me o porquê de eu estar a sair e de estar a ler notícias independentes como o Meduza. Foi um dos momentos mais assustadores da minha vida”, descreveu.
https://zap.aeiou.pt/nao-vou-combater-numa-guerra-que-nao-e-minha-perante-a-ameaca-da-lei-marcial-cada-vez-mais-russos-optam-por-deixar-o-pais-465726
No fim de semana que se seguiu à invasão da Ucrânia pela Rússia, naquilo que Vladimir Putin categorizou como uma “operação militar especial”, Vlodimir Zelenskyy decidiu implementar a lei marcial, a qual determinava que os homens com idades compreendidas entre os 18 e os 60 anos não poderiam abandonar o país e ajudar as suas forças militares nos combates. Mais de uma semana após o início do conflito, que não parece ter fim à vista, e contra todas as expectativas, há quem considere que o mesmo pode ser feito na Rússia, o que tem levado muitos a abandonar o país.
Foi o caso de Alexis Trubetskoy, diretor de uma escola de línguas em Moscovo, que na manhã em que a guerra começou decidiu que tinha de sair da Rússia. “Acordei, li as notícias em choque e percebi que tinha de sair o mais rápido possível. Ficou claro para mim que aquela invasão horrível iria mudar a Rússia para sempre“, explico ao The Guardian. “Espero voltar ao país que adoro, mas não é claro o que vai acontecer depois disto. O meu futuro foi me tirado, o país não será o mesmo.”
De acordo com jornalistas de órgãos de comunicação ocidentais que permanecem na Rússia, esta tem sido uma atitude cada vez mais adotada pelos cidadãos, sobretudo após a entrada em vigor da suspensão da circulação nos espaços aéreos de muitos países europeus — e não só —, o que evidencia o isolamento a que o país está destinado, fruto das sanções que lhe foram impostas.
Desde o início da invasão, mais de 7500 pessoas foram detidas em protestos anti-guerra em todo o território russo, segundo o site independente OVD-Info. Na mesma linha, esta sexta-feira ficou marcada pelo encerramento de muitos meios de comunicação russos que resistiam ao discurso do Kremlin, mas também pela suspensão da emissão de alguns meios de comunicação ocidentais, como a BBC, e redes sociais em solo russo.
Aqueles que abandonam o país mostram preocupação em relação às consequências económicas que a Rússia enfrentará a médio e longo prazo: desde que as sanções foram impostas, o rublo entrou em queda livre e a bolsa de valores tem estado fechada para evitar consequências mais gravosas. Diariamente, sucedem-se os anúncios das empresas ocidentais que vão suspender a sua atividade comercial no país, contribuindo para o seu isolamento.
Segundo o The Guardian, as pesquisas com o termo “emigração” escalaram ao longo da última semana na Rússia, ao passo que múltiplos canais foram criados no Telegram com cidadãos a discutir formas de abandonar o país.
De acordo com os investigadores em demografia, é expectável que o país assista a um êxodo da sua “força de trabalho com qualidade”, a qual pressente que “não existe futuro para ela na Rússia”. “Este êxodo significará a degradação da nação. O país não tem uma grande base de talentos. Sem eles, a Rússia não se consegue desenvolver a si própria”, descreve Andrei Kolesnikov, investigador na Carnegie Endowment.
As saídas do país têm sido aceleradas, como referido, pelos rumores de que as autoridades podem estar prestes a decretar a lei marcial, uma posição sem precedentes na história recente da Rússia e que pressupõe o fecho das fronteiras.
“Juntei a minha família depois de um amigo me ligar e contar sobre esta história da lei marcial. Marcamos lugares no primeiro voo disponível na terça-feira e voamos para um país aleatório no qual eu nunca tinha estado antes”, descreveu Anton, um gestor numa grande empresa russa de combustíveis e gás. “Não planeio lutar numa guerra que não começou por decisão minha.”
Ontem, numa declaração breve à imprensa, um porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov rejeitou qualquer hipótese de imposição da lei marcial, ao passo que uma fonte num dos principais aeroportos de Moscovo também fez saber que o fecho das fronteiras era um cenário “pouco provável“. “Não fomos informados de nada. Acho improvável. Ao mesmo tempo, estamos em guerra, por isso vamos ver.”
No entanto, as especulações têm-se adensado, o que se tem refletido na quantidade de lugares disponíveis nos voos que ainda restam. De acordo com o The Guardian, os voos para Erevã, Istambul ou Belgrado estavam repletos e uma viagem só de ida para o Dubai teria que ser adquirida por um preço de 4006 dólares, quando antes a compra era possível por 334 dólares. Os bilhetes de comboio para Helsínquia, com partida de São Petersburgo, também têm esgotado com frequência.
Há também relatos de homens que enfrentaram interrogatórios no momento da partida. Andrei, um diretor de cinema que habitante de Moscovo, diz ter sido retido antes da sua partida para Baku. A sua bagagem foi revistada e um dos agentes analisou o conteúdo das suas mensagens privadas em diferentes aplicações.
“Ele pegou no meu telemóvel e passou horas a desligar pelas conversas. Felizmente, eu apaguei todas as mensagens nas quais afirmei a minha oposição à guerra, tanto no Telegram como no Signal”, relatou. “Fui questionado se ‘realmente’ amava o meu país e se estava contra a guerra. Perguntou-me o porquê de eu estar a sair e de estar a ler notícias independentes como o Meduza. Foi um dos momentos mais assustadores da minha vida”, descreveu.
https://zap.aeiou.pt/nao-vou-combater-numa-guerra-que-nao-e-minha-perante-a-ameaca-da-lei-marcial-cada-vez-mais-russos-optam-por-deixar-o-pais-465726
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